(crédito: Carlos Vieira/CB/D.A Press)
Há 50 anos, em julho de 1973, Danilo Barbosa se formava em arquitetura na Universidade de Brasília (UnB). Três anos depois, já trabalhando na Companhia de Planejamento de Brasília (Codeplan), com apenas 26 anos, passou a liderar o trabalho que criou o sistema de sinalização da nova capital federal. Ao lado dos monumentos de Oscar Niemeyer, do urbanismo de Lúcio Costa e do design de Athos Bulcão, as placas criadas por Danilo, hoje com 74 anos, completam a narrativa estética coesa da cidade, símbolo máximo do modernismo e Patrimônio da Humanidade pela Unesco.
Desde 2012, uma peça do projeto faz parte do acervo permanente do Museu de Arte Moderna (MoMA), de Nova Iorque, um reconhecimento internacional. Em 2010, Danilo Barbosa foi procurado pelo diplomata André Corrêa do Lago, membro do Comitê de Arquitetura e Designer do MoMa, dizendo que admirava muito o projeto de sinalização de Brasília e gostaria de submeter a aprovação. “Ele não prometia nada. Preparei projeções, materiais impressos e, somente em 2012, nos pediram para enviar uma peça que estivesse implantada na cidade, em tamanho real. Escolhemos a peça que sinaliza a Unidade de Vizinhança 107/108, 307/308 Sul, por ser a única edificada de acordo com o projeto de Lúcio Costa para Brasília”, recorda-se Danilo.
Em junho de 2012 Danilo e André Corrêa receberam a resposta do MoMA comunicando que o projeto das placas, pelas características de integração à paisagem de Brasília, de designer (desenho simples e adequado ao desenho urbano de Brasília e pela sua perfeita integração à paisagem, ao urbanismo e arquitetura da cidade), tinha sido aceito. “Esse reconhecimento já foi, para Brasília, de uma importância muito grande a nível internacional”, reforça Danilo.
Arquiteto e designer autodidata, Danilo se encontrou com a reportagem no pilotis do bloco onde mora, na Asa Norte, e contou mais detalhes do processo de criação das placas e totens que guiam os brasilienses diariamente aos seus destinos. A principal preocupação do projeto, segundo Barbosa, foi a integração com os trabalhos de Niemeyer e Costa, objetivo atingido com perfeição. A sinalização de Brasília tornou-se um dos símbolos da cidade. “Fizemos um estudo preliminar durante seis meses, buscando alternativas de abordagens da sinalização. Um aspecto que gosto de ressaltar é que tive toda a liberdade para montar a equipe, o que não seria possível hoje em dia”, relata o arquiteto.
Danilo Barbosa chegou a ir ao Rio de Janeiro para mostrar o estudo no qual estava se empenhando para Lúcio Costa, que fez algumas recomendações que ajudaram a reconduzir o trabalho. “Fizemos protótipos de madeira e começamos a experimentar pela cidade, com letras de diferentes espessuras e fundos diversos, em diversas situações, observando a aplicação no material refletivo”, detalha o arquiteto. O projeto foi concluído em 1976 e a nova sinalização começou a ser implantada no ano seguinte. A fonte escolhida foi a helvética, simples e de fácil reconhecimento.
Como funciona
A sinalização de Brasília tem algumas peculiaridades, entre elas o uso de totens e a coloração das placas. As de fundo verde dão sinais direcionais, que mandam os usuários a algum destino. Ao chegar a esse destino, a sinalização terá fundo azul e letras brancas. As codificações de pontos turísticos seguem o padrão internacional, com fundo marrom, podendo dar uma informação direcional ou a identificação do local, sem setas.
O alfabeto usado nas placas é dimensionado de forma que os motoristas consigam apreender o que está escrito em uma velocidade de até 80 km/h. Os suportes das placas vão ganhando características diferentes à medida que são implantados em diferentes escalas da cidade.
O sistema de placas é pensada tanto para motoristas quanto para pedestres. Um exemplo são os prismas triangulares que identificam os blocos dentro das superquadras, informação que pode ser decodificada de qualquer direção. Outro são os totens localizados nos extremos das quadras, orientando a localização de cada um dos blocos. “Nem toda cidade tem sinalização para pedestres. É um grande diferencial de Brasília. A sinalização tem que abranger toda a população e o pedestre receber a mesma atenção que o motorista”, ressalta Danilo Barbosa.
Os pictogramas das placas turísticas também são destaque. No padrão nacional, um templo religioso é sinalizado com o desenho de uma igreja barroca, muito diferente das curvas modernas de Niemeyer. Em Brasília, as placas contam com o desenho específico de cada um dos pontos turísticos, como a Igrejinha da 308 Sul e os palácios do Governo Federal.
No trânsito, os motoristas têm acesso à pré-sinalização, posicionada antes da entrada desejada, e a sinalização de confirmação, colocada após a entrada, com a famosa seta apontando para baixo. “A organização de Brasília em quadras e blocos demanda uma sinalização diferente das outras cidades brasileiras”, observa.
No entanto, Danilo denuncia que muito do projeto original vem sendo desrespeitado. “Placas fora do padrão, com distanciamentos diferentes do previsto e erroneamente diagramadas, instituições privadas colocando sinalização em área urbana, o que não é permitido pelos planos diretores de publicidade e sinalização. Em muitos locais, as placas foram abarroadas há muito tempo e não foram repostas, por conta da estrutura precária de manutenção do governo”, lamenta.
Brasília
Danilo Barbosa é de São José do Rio Preto (SP). Em 1968, chegou a Brasília, patrimônio que ajudou a construir, contribuindo enormemente para o vai e vem diário da capital, lugar que escolheu para viver definitivamente. “Eu tive uma sensação muito boa quando cheguei aqui, fiquei muito impactado.Fui muito bem acolhido e me apaixonei pela cidade”, confessa.
Pelas ruas da cidade que ama, pedestres e condutores percebem a excelência do trabalho feito por Danilo. Gabriel Santos, 27 anos, é motoboy. Morador do Novo Gama (GO), ele chega a rodar 200 km em dias movimentados durante as entregas na região central do DF. “A sinalização facilita bastante o nosso trabalho. Aqui na Asa Sul é muito tranquilo”, analisa, enquanto descansa em um ponto de táxi.
Na Igrejinha da 308 Sul, as turistas sergipanas Carmen Lúcia, 52, e Silvânia Lisboa, 50, ambas professoras, aproveitam o passeio para fazer registros no templo adornado pelos azulejos de Athos Bulcão. “As placas me chamaram atenção. As placas passam as informações de forma objetiva, da forma de como funciona a cidade. Para gente que não é daqui, facilita muito”, diz Carmen.
A amiga Silvânia afirma que a sinalização a ajudou a se localizar mais cedo, quando saiu para passear a pé pela cidade. “As placas também ajudam a nos guiar para as partes para as quais queremos ir, já que a cidade é muito setorizada”, avalia.