ROBERTO STUCKERT/PR
Em pronunciamento na manhã desta segunda-feira (24/4) no Fórum Empresarial Brasil-Portugal, em Matosinhos, na região do Porto, em Portugal, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a criticar a alta taxa de juros do Brasil e reiterou que não vai vender empresas estatais.
“Nós temos um problema, primeiro-ministro (António Costa, premiê de Portugal), que não sei se Portugal tem, que a nossa taxa de juros é muito alta, é muito alta. No Brasil, a taxa Selic, que é a taxa referencial, está a 13,75%. Ninguém toma dinheiro emprestado a 13,75%, ninguém”, disse Lula, que está em viagem oficial em Portugal desde sexta-feira (21/4).
“E a verdade é que um país capitalista precisa de dinheiro, e esse dinheiro precisa circular, não apenas na mão de poucos, na mão de todos”.
“É por isso que eu digo sempre: a solução do Brasil é a gente voltar a colocar no Orçamento, é a gente garantir que as pessoas pobres possam participar, porque quando eles virarem consumidores, eles vão comprar; quando eles comprarem, o comércio vai vender; quando o comércio vender, vai gerar emprego; quando o comércio vender, vai comprar mais produtos da fábrica; não precisa importar da China, pode comprar produtos produzidos no Brasil, e a gente vai gerar mais emprego, e mais emprego vai gerar mais salário; é uma coisa mais normal da roda gigante da economia funcionando e todo mundo participando”.
Lula também reiterou que seu governo não vai vender estatais.
“No Brasil, não vamos vender as empresas públicas. Queremos convidar os empresários para fazer parcerias naquilo que a gente precisa criar de novo”, afirmou.
Segundo Lula, nos últimos seis anos, estatais foram vendidas “simplesmente para pagar juros da dívida pública”.
“Ou seja, nos desfizemos do nosso patrimônio, e a qualidade do serviço não melhorou”, disse o petista, citando o caso da Eletrobras.
Lula falou a empresários na sequência do primeiro-ministro português, António Costa.
Juros altos
Não é a primeira vez que o petista critica os juros no Brasil. Desde o início de seu mandato, ele vem se queixando do patamar dos juros e pressionando por sua redução.
Também tem feito críticas públicas ao presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto. Parlamentares e empresários, também.
Na semana passada em Londres, no Reino Unido, Campos Neto destacou a independência do Branco Central e defendeu a subida dos juros no ano passado.
“O Banco Central fez a maior alta de juros num ano de eleição na história do mundo. Isso mostra que o BC atua de forma bastante independente. Na política monetária, quando você age antes, o custo é menor”, disse o presidente do BC em palestra na conferência em Londres.
Na visão de Campos Neto, se os juros não tivessem subido em ano de eleição, a inflação não seria 5,8%, mas de 10%, como previsto pelas projeções.
“A inflação esperada no outro ano seria 14% e, se isso tivesse acontecido, basicamente a gente teria que estar com juros de 18,75% para ter o mesmo objetivo. E teria, muito provavelmente, que subir o juros para o ano que vem, colocando o país numa recessão, alguma coisa entre 3% e 4%, que foi a última coisa que aconteceu da última vez que o Brasil tentou ‘cair’ os juros”, assinalou ele, falando para uma plateia de empresários, ex-ministros da Fazenda, ex-presidentes do Banco Central e parlamentares.
Segundo Campos Neto, embora o “anseio dos juros seja político” o trabalho do Banco Central “é técnico”.
“O timing técnico é diferente do timing político, por isso a autonomia é importante. O custo de combater inflação é alto e sentido no curto prazo, mas o custo de não combater é mais alto e perene”, afirmou.
Para o presidente do Banco Central, a taxa Selic alta se justifica porque as previsões econômicas para os próximos anos no Brasil se deterioraram.
“De novembro para cá, as expectativas começaram a se deteriorar, tanto para 2025 quanto 2026.”
No dia anterior, em fala no mesmo evento, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), pediu a Campos Neto uma redução das taxas de juros no Brasil.
Diante do presidente do BC, que estava na plateia da conferência, Pacheco afirmou haver um “consenso” entre o governo federal, o Congresso Nacional e empresários de que a taxa de juros precisa baixar.
“Não conseguiremos crescer o Brasil com taxa de juros a 13,75%. Temos um novo governo com uma forma de pensar o país, um Congresso que tem suas perspectivas. Há divergências no meio empresarial. Mas se há algo que nos une é o desejo de reduzir a taxa de juros no Brasil”, disse.
“Nós aprovamos a autonomia do Banco Central, que foi fundamental. Mas a perspectiva dessa autonomia é para que o BC não fosse suscetível a interferências indevidas. Há um sentimento de que precisamos encontrar caminhos para a redução imediata da taxa de juros.”
Segundo Pacheco, a redução dos juros “é o desejo do Congresso, da economia e do setor produtivo, junto com o arcabouço fiscal.”
O que é a taxa Selic?
A taxa Selic (sigla para Sistema Especial de Liquidação e de Custódia) serve como referência para todas as taxas de juros do mercado brasileiro e é definida pelo Copom, grupo composto pelo presidente e diretores do Banco Central. Eles se reúnem para definir a trajetória da Selic.
A Selic é o principal instrumento de política monetária usado pelo Banco Central para controlar a inflação.
Quando a taxa sobe, os juros cobrados em financiamentos, empréstimos e no cartão ficam mais altos e isso desencoraja o consumo — o que, por sua vez, estimula uma queda na inflação. Por outro lado, se a inflação está baixa e o BC reduz os juros, isso barateia os empréstimos e incentiva o consumo.
Para definir o que fazer com a Selic, o BC avalia as condições da inflação, da atividade econômica, das contas públicas e o cenário externo — sempre com o objetivo de manter a inflação dentro da meta.
O instrumento é usado por todos os governos e autoridades monetárias. O Federal Reserve (Fed), o banco central dos Estados Unidos, define os juros básicos da economia americana. O Banco Central Europeu faz o mesmo com os juros nos países que compõem a zona do euro.
No Brasil, o mais recente ciclo de alta começou em 17 de março de 2021. Desde então, a Selic subiu 12 vezes consecutivamente, de 2% para 13,75%, patamar atingido em agosto do ano passado. Desde então, permanece inalterada. É o nível mais alto desde 2016, quando a taxa começou o ano em 14%.