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Pense um pouco na enrascada em que se meteu Kevin McCarthy, o presidente republicano da Câmara dos Representantes, que fez uma confusão ao falar sobre o ex-presidente americano Donald Trump.
Na semana passada, McCarthy causou uma tempestade política quando disse em uma entrevista na televisão que não sabia se Trump era o candidato republicano mais forte para a eleição presidencial de 2024. No dia seguinte, McCarthy voltou atrás e afirmou ao Breitbart News que “Trump está mais forte hoje do que em 2016”.
A fala do republicano foi branda, mas a reação dos apoiadores de Trump foi estridente. “McCarthy pisou na bola”, declarou Bryan Lanza, um ex-funcionário do governo Trump que ainda é próximo do ex-presidente. “[McCarthy] não pode se dar ao luxo de ser visto como leniente em relação a Trump ou vai perder seu cargo de presidente.”
McCarthy não é o único a ter dúvidas em relação a Trump. Muitos na liderança do partido temem que Trump ganhe a disputa interna pela candidatura — mas depois perca a eleição presidencial. Esses críticos acham que Trump tem muitos pontos fracos e adorariam ver uma alternativa — alguém que pudesse ser popular entre os eleitores indecisos dos EUA.
No momento, porém, essa alternativa parece não existir. De fato, a rápida operação para abafar as declarações de McCarthy nos diz muito sobre o controle que Trump exerce sobre seu partido.
Apesar de ter sido indiciado duas vezes, assolado por escândalos e investigações legais em andamento, e esteja enfrentando vários rivais políticos, Trump ainda é o grande favorito para conquistar a candidatura de seu partido à presidência. Uma pesquisa da rede NBC News mostra que na semana passada ele tinha 51% de apoio entre os eleitores republicanos, contra 46% em abril.
Entenda a seguir, em três pontos, o que está acontecendo.
1. Os problemas de Trump na Justiça estão ajudando, e não prejudicando sua candidatura (por enquanto)
Donald Trump foi considerado responsável por agressão sexual e foi acusado sob a Lei de Espionagem por manter documentos confidenciais depois de deixar a Casa Branca. Ele também está enfrentando acusações em Nova York por supostos pagamentos feitos a uma estrela pornô durante sua campanha presidencial de 2016.
Nada disso jamais havia acontecido com um ex-presidente. E ele pode ainda vir a ser indiciado por tentar fraudar a eleição no Estado da Geórgia e por seu papel na invasão do Capitólio em 6 de janeiro de 2021. São muitos os problemas legais.
Mas quanto mais indiciamentos ele enfrenta, mais Trump consegue convencer seus partidários de que está sendo vítima de uma vingança política.
“As acusações o ajudaram junto à base de eleitores e o ajudaram na arrecadação de fundos”, diz Michael Steele, ex-presidente do Comitê Nacional Republicano e agora um opositor de Trump.
“E quando sair o indiciamento do caso da Geórgia, seus números nas pesquisas vão subir novamente”, acrescenta.
Mas em uma campanha para eleições gerais — fora do processo das primárias americanas — esse sentimento pode mudar, e os eleitores indecisos podem decidir que não querem apoiar alguém acusado de cometer crimes.
2. Os demais candidatos estão dividindo os votos daqueles que são contra Trump
Atualmente, mais de uma dúzia de republicanos estão concorrendo à presidência.
Alguns se apresentam como sendo o “substituto de Trump”, outros como “anti-Trump”, enquanto uma parte tenta simplesmente ignorá-lo.
As pesquisas sugerem que cerca de metade dos eleitores republicanos não são totalmente apaixonados pelo ex-presidente, mas por enquanto eles estão dividindo sua lealdade igualmente entre todos os outros candidatos.
Dividir para conquistar foi uma estratégia bem-sucedida de Trump em 2016 — e parece estar funcionando novamente.
Mas e Ron DeSantis, governador da Flórida, que deveria ser o grande adversário de Trump?
Até agora, seus números estão caindo, e não subindo. Não é nenhum segredo nos círculos republicanos que DeSantis tem sido visto como um candidato fraco: quanto mais as pessoas o veem na disputa, menos elas gostam dele.
“Nenhum dos outros candidatos importa”, conclui Steele.
Para ele, só um ato divino tira de Trump a indicação republicana para a Casa Branca.
3. A disputa tem mais a ver com luta do que com conservadorismo
Os dias da campanha otimista de Ronald Reagan — anunciando que havia uma “nova manhã nos Estados Unidos” — acabaram. O Partido Republicano de hoje está procurando alguém que possa lutar por ele em questões culturais, como aborto e direitos de pessoas transgênero, e que não tenha medo de enfrentar nem sequer o establishment republicano.
Não há lutador melhor do que Donald Trump, o homem que enfrentou (e venceu) fisicamente outro bilionário em uma luta livre em 2007. Nenhum candidato chama a atenção e desperta a raiva da multidão como Trump.
É bom lembrar que, nessa mesma fase da campanha eleitoral de 2016, Trump tinha apenas 6% dos votos entre os republicanos. Mas comício após comício, debate após debate, ele foi derrotando seus oponentes. Ele fez isso atacando-os duramente (com palavras que, às vezes, parecem socos) e dizendo aos eleitores que estava tão furioso quanto eles com a situação do país.
Os candidatos rivais continuam esperando que os eleitores das primárias se cansem de todo o caos em torno de Trump ou que seus problemas na Justiça o derrubem nas pesquisas.
Mas isso não preocupa a base de Trump.
“Ninguém está batendo Trump”, diz Lanza, ex-funcionário de Trump, confiante.
“Presumo que todos que ainda estão concorrendo estão fazendo um teste para um cargo no gabinete [na Casa Branca de Trump].”