(crédito: Beto Barata/PR)
O ex-presidente Michel Temer, constitucionalista e constituinte, é mais uma importante voz que se soma à defesa da capital do país e do Fundo Constitucional do Distrito Federal (FCDF). Assim como Temer, entendem a singularidade de Brasília os ex-presidentes José Sarney e Fernando Henrique Cardoso, que sancionou a lei criadora do FCDF com os critérios em vigor há 21 anos, atrelada à receita corrente líquida da União.
Em entrevista ao Correio, Temer diz que o Fundo Constitucional, instituído pelo Congresso e sancionado por FHC nos últimos dias do segundo mandato, foi “o reconhecimento da situação especial que cabe ao Distrito Federal no concerto federativo.”
Temer acredita que, na votação do Arcabouço Fiscal, na semana passada, deputados federais tentaram redistribuir as verbas orçamentárias da União, tirando recursos do DF. Mas, na visão do ex-presidente, a medida “vulnera a concepção de que o Distrito Federal merece tratamento diferenciado”.
E analisa: “A redução desses valores numa entidade federativa que teve aumento populacional extraordinário certamente prejudica a sua gestão administrativa”.
O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso sancionou a lei que regulamentou o Fundo Constitucional no fim do segundo mandato, em 2002. Foi um legado importante da gestão?
Importantíssimo. Foi, na verdade, o reconhecimento da situação especial que cabe ao Distrito Federal no concerto federativo”.
O senhor era deputado federal. Houve resistência no Congresso?
Não. Verificaram-se, como era natural, os mais variados debates, mas houve a compreensão de que o Distrito Federal deveria ter um tratamento diferenciado dos estados federados.
Por que, na sua visão, o Fundo Constitucional do DF volta ao debate agora?
Ofereceu-se, na oportunidade do chamado Arcabouço Fiscal, que, registro, nada mais é do que o teto constitucional readaptado, ocasião para redistribuição das verbas. Com muita naturalidade, deputados entenderam que deveriam reduzir as verbas do Fundo Constitucional para alocá-las em outras rubricas, o que, com a devida licença, vulnera a concepção de que o Distrito Federal merece tratamento diferenciado.
O relator do Arcabouço Fiscal na Câmara dos Deputados, Cláudio Cajado (PP-BA), disse que estabeleceu um teto de correção do Fundo Constitucional porque precisava adotar um critério. Mas Brasília não seria única por ser a capital?
Sem dúvida.
Já houve outras tentativas do Congresso de reduzir, partilhar ou até de extinguir o Fundo Constitucional. Por que políticos de várias unidades da Federação têm interesse em diminuir os repasses para o DF?
Pela razão, penso eu, que expus em resposta anterior.
Mexer no Fundo Constitucional causa instabilidade na gestão e o risco de novas mudanças?
Penso que sim. Afinal, os valores do Fundo se destinam a cobrir os valores referentes a segurança pública, a saúde e a educação. A redução desses valores numa entidade federativa, que teve aumento populacional extraordinário, certamente prejudica a sua gestão administrativa.
Brasília é muito mais do que a sede dos Três Poderes, das embaixadas e dos organismos internacionais. Acredita que houve discriminação ou desconhecimento em relação à cidade por parte dos congressistas?
Não creio. A razão é meramente numérica no tocante a distribuição dos recursos.
O senhor morou muitos anos em Brasília. Como enxerga a cidade?
Primeiro, como local de extraordinária qualidade de vida, onde se respira progresso e desenvolvimento. Mas, o importante da nova capital foi a interiorização do país. Ou seja: deu-se uma integração de todos os estados no Planalto Central.
O senhor acha necessária a existência do FCDF? Por quê?
Sem dúvida. É umbilical a ligação da União Federal com o Distrito Federal. Afinal, este último é a sede administrativa e política da União. Daí a ligação indispensável entre estas duas unidades federativas. E daí, também, a razão de um Fundo para prover suas necessidades.
Como o senhor vê o futuro de Brasília?
Com otimismo. Concentrando as superiores funções executiva, legislativa e judiciária, sua atuação se espraia por todo o país. E a tendência é dar-lhe, cada vez mais, maior importância.
Por que Brasília ainda não conseguiu desenvolver uma vocação fora do serviço público ou comércio e serviços, para, aos poucos, conquistar a autonomia financeira?
Foi pensada como sede dos Poderes, jamais como polo de industrialização ou de grande comércio.